PARTO

Escrevo para expelir do meu âmago,
A loucura artística.
Os olhos cegos para o mundo,
A mente lúcida na incansável percepção do ser.

Que a contemplação desmedida,
De gestos involuntários e de gritos cortantes,
Nesta civilização fingida,
Se materialize nesta folha de papel.

Quanto mais entro em mim,
Mais livre sou, mais regurgito.
Sinto palpitar, dorida, a minha cabeça.
Minha inspiração febril faz-me transbordar.

Gelada.
Em momentos insanos.
Sou fora deste mundo,
Sou um mundo em mim.

De essência! De sentido!
Consigo desmaterializar-me em pó de estrelas,
No começo de tudo.
Na ânsia do saber, da procura da verdade.

Que formigueiro é este que me percorre?
Que me faz arranhar meu corpo.
Até sangrar.
Até fazer minha alma quente escorrer pelo meu peito.

Sorvo-me e impludo,
Numa emoção frenética,
Numa criatividade convulsiva.
Epiléptica!

Arranco-me de mim,
Compulsivamente.
Escrevo para que eu possa existir,
Enquanto ser, único.

Que a arte expatrie a teoria, a técnica.
Seja ela a expressão límpida do nosso espírito,
Desbotada de minuciosidades,
Rica de sentido uno.

Que se banem os academismos!
As correntes pesadas e ferrugentas,
Que nos puxam para um precipício
Do qual não se ouve o fundo.

A arte é refúgio da alma,
É a génese do ser e da explosão emocional.
Uma amálgama de sentir e pensar,
Abalroada em cada fôlego.

Seja a compreensão do mundo,
Esta fadiga que transpiro.
Ganhe vida, ela, que colida com a tua,
Provocando o parto de uma nova ideia.

Livre da jaula do preconceito,
Não seja mais domada pelo formalismo do erudito.
Que de tanto que quer ver,
Fica cego, imune à beleza da obra.

De um colorido espontâneo,
De uma paixão assolapada,

De uma força intrínseca,
De uma mão cheia de nada.



"Na música não há teorias...basta escutar. A regra é o prazer!" Debussy




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