CARTA I
Queria poder dizer que já me cresci. Que já sou velha e que já sei de tudo, Até já nem saber de nada. Foi-se tudo num triz, que já me despedi. Os pés estavam amarrados às mãos. Num sopro frio. Ainda tenho o frio. No corpo. Na voz. De dentro para fora. Naquilo que me sai da boca e que fica a meio. Do sonho. P'lo caminho ficou-se a vontade de me ficar. A porta ficou aberta de par sem par. A minha tristeza a descoberto, enrubescida. A corrente no ar degolou o suspiro, por último. Não me tomei a sério. Engoliram-me os sonhos e fiquei-lhes sem rasto. Perdi-me em passos presos ao meu arrasto e dexei-me ao relento da indiferença. O meu corpo já era só carne por baixo do chão, e só vos ouvia o andar, ao de leve, aqui e aqui. Não sobrava nada por debaixo do orvalho. A queda foi tão funda que me virei do avesso. Parti-vos as memórias e deitei-me sobre os estilhaços. Cobri-me de sangue de ninguém. Não tinha cor. Nem calor. Nem sabor. Nem eu. Queria poder dizer que já me fui. Que já s